Esboço # 42

(O sol pousa lentamente sobre o mar; o calor ainda é intenso, apenas suavizado por uma ténue brisa que sopra a intervalos regulares, quase previsíveis. Há pouca gente na praia; Ele está deitado sobre a areia, indolente e imóvel, pensativo; Ela, um pouco afastada, parece dormir.)
ELE (voz arrastada, amorfa): Há quanto tempo passamos férias juntos?
ELA (sem se mover mas abrindo os olhos; num tom quase indiferente): Uns cinco, acho. (Volta a fechar os olhos; compõe o corpo na toalha.) Porque perguntas?
ELE (olhando-a com súbita intensidade, espiando-lhe o corpo com timidez): Porque desde essa altura que me apetece dormir contigo.
(Ela sorri, depois olha-o com curiosidade, talvez com carinho; Ele desvia o olhar, embaraçado e receoso.)
ELA (num tom plácido, ligeiramente condescendente): Eu sei.
(Ele mantém-se tenso, sentindo o olhar dela; ouve-se uma gargalhada distante, logo engolida pelo monótono rugido das ondas. Ela passa a mão pela coxa e, depois, acondiciona o fato de banho ao corpo num gesto que poderia ser considerado provocador. O sol move-se muito lentamente: mas ninguém o olha.)
ELA (muito tempo depois): Eles já devem estar à nossa espera. (Não se move, Ele não reage.) É melhor irmos andando.
(Mantém-se imóveis, indiferentes à passagem do tempo; confortáveis. Alguém que os olhe talvez pense que formam um casal feliz.)