Dizias-me:
por vezes, as palavras não bastam. E eu respondia: sim, tens razão; mas, por
outro lado, sem palavras não existimos. Havia um silêncio e concluías: apenas
com palavras, também não.
Foi
na última vez que tivemos esta conversa que decidi escrever-te um livro. E colocar
nesse livro tudo o que tenho para te dizer, todas as palavras que quero que
sejam tuas, que guardes em ti. Talvez as palavras não nos bastem porque somos
incapazes de as guardar, de as tornar parte de nós; não achas? Tontice minha,
talvez. Mas não acreditas que uma palavra exacta dita no momento adequado poderá
ter tanta importância como… sei lá… um dedo? Não tens guardadas em ti palavras
que são tão físicas e palpáveis, tão visíveis e fundamentais, tão vivas, tão pele-e-carne-e-sangue-e-osso
como cada um dos dedos das tuas mãos?
Pensei,
então, em escrever-te um livro e nele colocar todas as palavras que quero que sejam
tuas. Para que as possas ler sempre que desejares, como desejares. Para que,
por um momento, possas imaginar que são apenas tuas, criadas para ti. Para que
te apropries delas e nelas me encontres. Para que as possas sentir; como se
fossem dedos. Pele-e-carne-e-sangue-e-osso.
(Imagem: John Tarahteeff)