(I) Lembro-me onde estava no dia 11 de Julho de 1993: Estádio José Alvalade. Ali à frente, a minha banda preferida. Cantei, dancei, pulei, gritei. Acho que chorei. Fui de expresso com uma amiga, comprei uma t-shirt. Também me lembro onde estava no dia 8 de Julho de 2017: Passeio Marítimo de Algés. Ali à frente, a minha banda preferida. Cantei, dancei, pulei, gritei. Sei que não chorei. Fui com a família, não comprei nenhuma t-shirt. Entre os dois momentos, passaram vinte e quatro anos; e apesar da banda preferida ser a mesma, tudo parece infinitamente diferente. Ou tudo parece tão semelhante? Continua a existir uma sensação de pertença e de identificação quando se grita em conjunto com milhares de pessoas desconhecidas frases que são sentidas como slogans pessoais, como revelações íntimas. Continua a fazer sentido, tal como fazia há vinte e quatro anos, partilhar com a multidão anónima confissões e apelos como “Now I'm not looking for absolution, Forgiveness for the things I do, But before you come to any conclusionsTry walking in my shoes.” Uma forma pagã de reza, talvez. A procura de um qualquer Deus: “Your own personal Jesus, Someone to hear your prayers, Someone who's there.” Cada um reza como pode, como sabe, como consegue, como precisa; com o timbre individual do seu desespero.
(II) Desde a adolescência que desconfio que não existe Deus. Confesso que gostava que existisse, dava-me jeito que existisse, por vezes até tenho uma certa inveja de quem está convencido que existe. Mas não consigo acreditar, basta abrir os olhos e olhar em redor: as evidências que comprovam a impossibilidade de existência de um ser superior, perfeito e omnipotente, bondoso, saltam de todos os lados. Haverá quem diga exactamente o oposto, que saltam à vista as evidências que comprovam essa existência. Questão de perspectiva, questão de fé. Ou questão de desespero.
(III) Tenho uma amiga que diz que o destino é um palhaço. Entre nós, concordamos que o destino brinca e provoca, desconcerta, baralha; ou seja, faz palhaçadas; mas em vez de usar balões e esguichos de água e sapatões gigantes, usa as nossas vidas. Fingimos que não mas, no fundo, temos algum medo porque a total arbitrariedade e imprevisibilidade assusta um pouco. Ou muito, talvez assuste mesmo muito. E deve ser por causa desse medo ancestral que procuramos incessantemente um sentido, uma lógica, uma coerência. Procuramos um qualquer “Personal Jesus” que domestique o destino e o obrigue a portar-se bem connosco, que nos permita esquecer que somos apenas uns balõezinhos nas mãos de um palhaço descontrolado; que nos permita esquecer que a qualquer momento podemos rebentar; que nos dê a ilusão de que existe um sentido e um propósito em rebentarmos.
(IV) Talvez não pareça mas esta crónica é sobre o inominável. EN 236-1. E termina como começou, com os Depeche Mode: “I don't want to start any blasphemous rumors but I think that God's Got a sick sense of humor and when I die I expect to find Him laughing.”
(II) Desde a adolescência que desconfio que não existe Deus. Confesso que gostava que existisse, dava-me jeito que existisse, por vezes até tenho uma certa inveja de quem está convencido que existe. Mas não consigo acreditar, basta abrir os olhos e olhar em redor: as evidências que comprovam a impossibilidade de existência de um ser superior, perfeito e omnipotente, bondoso, saltam de todos os lados. Haverá quem diga exactamente o oposto, que saltam à vista as evidências que comprovam essa existência. Questão de perspectiva, questão de fé. Ou questão de desespero.
(III) Tenho uma amiga que diz que o destino é um palhaço. Entre nós, concordamos que o destino brinca e provoca, desconcerta, baralha; ou seja, faz palhaçadas; mas em vez de usar balões e esguichos de água e sapatões gigantes, usa as nossas vidas. Fingimos que não mas, no fundo, temos algum medo porque a total arbitrariedade e imprevisibilidade assusta um pouco. Ou muito, talvez assuste mesmo muito. E deve ser por causa desse medo ancestral que procuramos incessantemente um sentido, uma lógica, uma coerência. Procuramos um qualquer “Personal Jesus” que domestique o destino e o obrigue a portar-se bem connosco, que nos permita esquecer que somos apenas uns balõezinhos nas mãos de um palhaço descontrolado; que nos permita esquecer que a qualquer momento podemos rebentar; que nos dê a ilusão de que existe um sentido e um propósito em rebentarmos.
(IV) Talvez não pareça mas esta crónica é sobre o inominável. EN 236-1. E termina como começou, com os Depeche Mode: “I don't want to start any blasphemous rumors but I think that God's Got a sick sense of humor and when I die I expect to find Him laughing.”
Crónica n.º 55 para o Jornal de Leiria.