(A praça está deserta, apenas eles ocupam uma das mesas da esplanada. Céu cinzento e claustrofóbico, ameaçador; talvez chova, mais tarde. Ninguém passa, não há crianças a brincar com carros telecomandados, velhos a espreitar os pombos. Apenas os dois, sentados numa mesa repleta de jornais, de destroços do pequeno almoço. Ele tem estado a falar, enquanto ela escuta distraidamente.)
ELE (num tom peremptório, quase pomposo): É o que penso, por mais que encham páginas a dizer o contrário não me fazem mudar de ideias. (Pausa breve. Tom algo condescendeste, sem a olhar.) Não achas que tenho razão?
ELA (após uma breve hesitação, como se tivesse demorado a perceber que ele se lhe dirigira. Tom desprendido, desinteressado. Esforçando-se para não encolher os ombros, não revelar enfado.) Acho que sim. (Continua a passar as páginas de uma revista, desatenta.)
ELE (depois de um longo silêncio, durante o qual prosseguiu a leitura): Gente de merda, sempre a mandar sentenças. A encher os jornais com pretensiosismos e arrogâncias. (Abana a cabeça, irritado. Sobe ligeiramente o tom de voz.) Como se um gajo não tivesse direito à sua própria opinião, a pensar por si.
(Durante algum tempo apenas se ouve o crepitar dos jornais, o som distante e esporádico do tráfego. Os pombos continuam a esvoaçar sem destino nem convicção, talvez intrigados com a ausência dos reformados. E o céu tão cinzento; mas é provável que não chova.)
ELA (olhando-o incisivamente; num tom sério, quase dramático): Há quanto tempo estamos juntos?
(Ele olha-a, surpreendido e perscrutador; um pouco intimidado com o seu tom de voz.)
ELE (hesitante): Quase dois anos. (Sorri, um pouco ansioso.) Vinte meses, acho eu. (Olha-a, simultaneamente inquieto e curioso.) Porque perguntas?
ELA (sonhadora, desviando o olhar; ignorando a pergunta, ignorando-o): Vinte meses. É capaz de ser isso. (Pausa breve. Ele aguarda que ela acrescente uma explicação, incapaz de regressar ao jornal; nervoso. E ela volta a encará-lo, sem complacência ou desafio. Tom neutro, distante; factual.) Acreditas que nestes vinte meses não disseste uma única frase que me interessasse verdadeiramente?
(E é então que lá no fundo da praça aparece a primeira criança da manhã, pedalando furiosamente a sua bicicleta resplandecente.)
ELE (num tom peremptório, quase pomposo): É o que penso, por mais que encham páginas a dizer o contrário não me fazem mudar de ideias. (Pausa breve. Tom algo condescendeste, sem a olhar.) Não achas que tenho razão?
ELA (após uma breve hesitação, como se tivesse demorado a perceber que ele se lhe dirigira. Tom desprendido, desinteressado. Esforçando-se para não encolher os ombros, não revelar enfado.) Acho que sim. (Continua a passar as páginas de uma revista, desatenta.)
ELE (depois de um longo silêncio, durante o qual prosseguiu a leitura): Gente de merda, sempre a mandar sentenças. A encher os jornais com pretensiosismos e arrogâncias. (Abana a cabeça, irritado. Sobe ligeiramente o tom de voz.) Como se um gajo não tivesse direito à sua própria opinião, a pensar por si.
(Durante algum tempo apenas se ouve o crepitar dos jornais, o som distante e esporádico do tráfego. Os pombos continuam a esvoaçar sem destino nem convicção, talvez intrigados com a ausência dos reformados. E o céu tão cinzento; mas é provável que não chova.)
ELA (olhando-o incisivamente; num tom sério, quase dramático): Há quanto tempo estamos juntos?
(Ele olha-a, surpreendido e perscrutador; um pouco intimidado com o seu tom de voz.)
ELE (hesitante): Quase dois anos. (Sorri, um pouco ansioso.) Vinte meses, acho eu. (Olha-a, simultaneamente inquieto e curioso.) Porque perguntas?
ELA (sonhadora, desviando o olhar; ignorando a pergunta, ignorando-o): Vinte meses. É capaz de ser isso. (Pausa breve. Ele aguarda que ela acrescente uma explicação, incapaz de regressar ao jornal; nervoso. E ela volta a encará-lo, sem complacência ou desafio. Tom neutro, distante; factual.) Acreditas que nestes vinte meses não disseste uma única frase que me interessasse verdadeiramente?
(E é então que lá no fundo da praça aparece a primeira criança da manhã, pedalando furiosamente a sua bicicleta resplandecente.)