(Estão sentados na varanda há horas, apenas iluminados pela lua; por vezes passa um carro algures, apressado e ruidoso, recordando que o mundo continua a girar. Conversam preguiçosamente e riem bastante; ou permanecem longos períodos em silêncio, confortáveis e serenos; levantam-se ocasionalmente para renovar as bebidas, para petiscar qualquer coisa, para passar pela casa de banho; mas regressam sempre, como se tivessem decidido permanecer na varanda até amanhecer. Nos primeiros meses do casamento era frequente ficarem juntos pela madrugada dentro, decididos a impedir que o sono os separasse momentaneamente, incapazes de se saciarem da companhia do outro; depois, quando tudo se tornou normal e previsível e rotineiro, os hábitos foram sendo alterados, devagarinho.)
ELE (após um longo período de silêncio): Conta-me um segredo. (Sorri, talvez nervoso ou arrependido.) Alguma coisa que nunca me tenhas contado, algo intímo e secreto e estranho.
(Ela olha-o, um pouco espantada. Estuda o seu perfil, escuta a sua respiração tranquila; pondera o que fazer, quase cede à tentação de mentir.)
ELA (numa voz arrastada e hesitante, apologética): Sabes, daquelas vezes em que te apetece fazer amor e finges não perceber os meus sinais, insistes apesar de saberes que eu não quero, apesar de saberes que não me apetece? (Ele move-se, desconfortável; ambos olham a escuridão.) Quando estás a fazer amor e eu à espera que termines, sabes o que sinto? (Hesita apenas um momento; num tom triste e desencantado.) É como se estivesse a ser violada. Sinto que estou a ser violada por um estranho. E nem posso gritar.
(Ele estremece, chocado; mas não fala, não se aproxima dela. Mantém-se em silêncio, agarrando os respectivos copos e olhando a lua; ambos com vontade de fugir mas incapazes de se moverem.)
ELE (após um longo período de silêncio): Conta-me um segredo. (Sorri, talvez nervoso ou arrependido.) Alguma coisa que nunca me tenhas contado, algo intímo e secreto e estranho.
(Ela olha-o, um pouco espantada. Estuda o seu perfil, escuta a sua respiração tranquila; pondera o que fazer, quase cede à tentação de mentir.)
ELA (numa voz arrastada e hesitante, apologética): Sabes, daquelas vezes em que te apetece fazer amor e finges não perceber os meus sinais, insistes apesar de saberes que eu não quero, apesar de saberes que não me apetece? (Ele move-se, desconfortável; ambos olham a escuridão.) Quando estás a fazer amor e eu à espera que termines, sabes o que sinto? (Hesita apenas um momento; num tom triste e desencantado.) É como se estivesse a ser violada. Sinto que estou a ser violada por um estranho. E nem posso gritar.
(Ele estremece, chocado; mas não fala, não se aproxima dela. Mantém-se em silêncio, agarrando os respectivos copos e olhando a lua; ambos com vontade de fugir mas incapazes de se moverem.)